sábado, 27 de dezembro de 2008

A FAMÍLIA AMERICANA E O SEU MODO DE VIVER

Martha e Mark (marido) moram numa original e bonita casa de madeira, às margens do Lake Jackson, o maior lago da cidade. A casa tem duas frentes, uma para a rua de acesso que circunda o lago e outra de frente para o mesmo, onde eles têm um cais particular. Ali há um ambiente coberto com um conjunto de cadeiras com centro, usado para pescar, descansar e receber amigos em um churrasco. Em anexo há a garagem dos barcos com uma lancha de velocidade para passear e puxar esquis, outra lenta para pescar e um jet-ski. Entre a casa e o lago, só um gramado e uma pequena praia, que aumenta e diminui a depender do nível do lago. No inverno o lago fica mais cheio, no verão mais baixo; o lago não se comunica com rios ou outros lagos, fica isolado. Ao contrário do que eu pensava, eles não devastaram a fauna e a flora do lago que não é não poluído. Já vi patos selvagens nadando em grupo ao amanhecer, pequenas tartarugas colocando a cabeça para o lado de fora da água para respirar, garças andando e pescando pela borda, aves do tipo gaivota que mergulham n'água em pleno vôo para caçar peixes, peixes saltando, sapos coaxando. Vi ainda fotografia dos meus sobrinhos com filhotes de crocodilos pegados à mão por eles e relato sobre a existência de cobras d'água não venenosas. Além disso ainda há as aves migratórias que passam por aqui no seu vai e vem do inverno e verão. Não há registro de ataque de crocodilos a pessoas, até porque são de uma variedade que não cresce muito. Mas nunca vejo banhistas no lago.
O casal tem 3 filhos, o mais velho Brian (25) mora só, em outra casa pequena e trabalha como "barman" no hotel do autódromo; ele é pai de Donovan (2), o meu sobrinho-neto, o primeiro membro da terceira geração da minha família nos Estados Unidos. Ele me disse que viu Hélio Castro Neves, um corredor brasileiro, acidentar-se em seu carro ontem. A filha do meio é Kara (20), que trabalha com os pais e por enquanto mora com o namorado na casa de Martha; ela está se preparando para ser vizinha de Brian em outra casa. O filho mais novo Tommy (19) mora na Universidade Estadual da Flórida, em outra cidade Gainsville, onde estuda engenharia. Nenhum dos filhos de Martha sabe português, pois ela infelizmente não falou a língua pátria com eles.
O casal tem uma firma que corta grama de casas e condomínios, onde Kara (pronuncia-se: "kéura") trabalha com o namorado Alan. Mark é construtor de casas (no momento está fazendo 9 casas em lugares diferentes) e Martha é corretora de imóveis há cerca de um ano. Antes disso ela ajudava o marido com as tarefas burocráticas e financeiras. Eles pertencem à extensa classe média americana e tem uma qualidade de vida equivalente a dos nossos ricos. Aliás poucos ricos no Brasil podem ter a qualidade de vida que eles tem aqui e que não é diferente da maioria. Eles não tem formação superior, o que aqui não lhes cria barreiras. Seus vizinhos são um engenheiro civil (que tem um avião monomotor que ele mesmo pilota) e um dono de corretora de seguros (com filiais em várias cidades) do outro lado. Todos integram uma mesma classe social, são amigos e os filhos freqüentam a mesma boa escola pública da cidade.
Até o segundo grau as crianças de todas as classes sociais estudam na mesma escola pública gratuita. Já as universidades são pagas, não há universidade pública e gratuita no país. A não ser que o aluno seja um expoente do esporte, como basquetebol ou futebol americano, e é disputado com bolsas para estudar gratuitamente nas melhores universidades do país. Ter um time vencedor é uma das formas mais baratas das universidades fazerem propaganda num mercado disputado. Como a universidade aqui é considerada cara, Martha comprou a bolsa para o curso completo dos filhos durante sua infância, o que saiu bem mais barato. Atualmente ela já começou a pagar a bolsa do neto.
Como a maioria das famílias americanas, minha irmã e meu cunhado são divorciados de casamentos anteriores. No caso, cada um aqui teve 2 casamentos anteriormente. É muito comum os filhos terem pais diferentes e seguirem a mãe em sua vida e seus futuros casamentos. Ao menos este casamento parece ter alguma solidez, pois aparentam viver bem há mais de 15 anos. Nenhum dos filhos de Martha é filho de Mark, que é estéril. Mas os filhos de Martha o tratam como pai e ele se porta como tal. Isto tudo é muito comum por aqui. A propósito do direito que um pai ou mãe tem de ver o seu filho menor, se um deles negar este direito ao outro, isto se resolve na hora. O prejudicado telefona para a polícia, que vai à casa de quem está criando o caso e ameaça de prisão se a lei não for cumprida naquele momento.
A polícia daqui é a mais discreta possível, você mal percebe sua presença. E o policial daqui tem autoridade para atuar diante de qualquer situação de infração da lei. O mesmo policial, atua sobre o trânsito, prende civis, militares, menores, autoridades e quem mais infringir a lei. Quando a gente passa na frente da Delegacia de Polícia, só vê vários carros da polícia estacionados. Que são aquilo que vemos nos filmes, nem velhos, nem de luxo; porém todos bem equipados e em perfeito estado de conservação. Cada policial tem uma viatura para trabalhar e o carro passa a noite em sua casa. Se ele sair com a viatura, deve estar fardado e em serviço. Se ele estiver de folga, usa seu automóvel particular e não usa farda, naquele momento ele é o cidadão. O policial aqui passa por um concurso disputado pelos jovens, em que ele precisa ter o colegial completo e ter sua capacidade física testada. Se for selecionado, vai para a Academia de Polícia Estadual e será remunerado tanto quanto qualquer profissional especializado com esta escolaridade. Em resumo, ele é respeitado pela sociedade, tem uma vida digna e não precisa morar vizinho aos marginais que teria que combater. Ser amigo de um policial é como ser amigo de qualquer cidadão comum.
Os americanos acordam tarde e dormem cedo. Como o amanhecer aqui é em torno das 7 horas, ninguém aparece antes deste horário. Quando acordam para ir para a escola ou trabalhar, vão para a copa/cozinha (daí a tal "cozinha americana") preparar um sanduíche e tomar um líquido, que pode ser até um refrigerante como preferem os mais jovens. Se ainda houver criança em idade escolar, o ônibus passa na porta e leva para a escola, de onde ele só retornará à tardinha. Lá ele estudará, praticará esportes, terá aula de educação musical e almoçará. Tudo isto está incluído nos impostos que cada cidadão paga. Se for descoberta alguma criança fora da escola, seu responsável será preso e o Estado assumirá a tutela desta criança, garantindo-lhe o direito de ser educada. Entendam porque elas acham estranhos os nossos menores abandonados pelas ruas no Brasil, pedindo ou até trabalhando.
Depois desjejum, cada um parte para cumprir sua rotina diária e às vezes o casal se encontra numa lanchonete por volta do meio dia. Ali se faz um lanche e retornam para o segundo período de trabalho. A família se encontra de novo ao final da tarde, ainda a tempo de praticar alguma forma de lazer. No caso dos classe média aqui desta casa: esquiar no lago, dar uma volta de jet-ski, ir a academia de musculação, passar na locadora para alugar um filme (apesar de terem inúmeros canais de televisão via cabo ou satélite). Ou então, quando não se tem mais criança para cuidar, o pessoal vai para um "happy-hour" que termina por volta das 20 horas. Às 21 horas os restaurantes estão às moscas, a não ser que seja um bar no fim de semana, onde os solitários de todas as idades tentam se encontrar. Para aqueles que foram para casa ao anoitecer, é hora de fazer a última refeição do dia, ver um pouco de televisão e dormir por volta das 22 horas.
Quando as pessoas cozinham, raramente usam tempero. Quase tudo que é comprado para cozinhar vem semipronto, é só colocar num forno, seja ele de microondas ou elétrico. O tempero é acrescentado na hora de se servir, ao gosto da pessoa. Aí tem uma profusão de temperos e molhos prontos de tudo para tudo. O fogão é elétrico e as casas têm ventiladores de teto em todos os cômodos, que geralmente ficam ligados permanentemente, pois a conta da energia elétrica aqui não pesa no bolso.
Atenção especial é dada às mascotes (pets). Que em sua maioria são cães e gatos, mas tem também pássaros em gaiola, peixes em aquário, roedores, répteis, batráquios, peçonhentos em geral e o que mais aparecer a gosto do freguês. Americano cumprimenta o cão da casa do amigo quando lá entra, fazem parte da família. Todos os cães usam coleiras com identificação, são mansos e criados soltos. E o animal não precisa ser de raça pura, tem muito vira-lata por aqui. Mas todos bem gordinhos e escovados. Cachorro de rico. Já perceberam que todo Presidente dos Estados Unidos tem um cão que sempre é registrado pela imprensa? Fazer compras é uma tarefa diária e praticada com muito prazer, um verdadeiro esporte, mas este é um tema que merece um capítulo novo.

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